Os acontecimentos decorrentes da agressão israelita ao Líbano, vieram agitar em alguns locais da blogosfera (nomeadamente aqui)a velha questão do anti-semitismo.
No fundo não há aqui nada de original. Segue uma linha decorrente do pensamento da direita americana que procura impedir a reflexão critica sobre a actual doutrina político-militar de Israel, nomeadamente em relação aos palestinianos.
A utilização do termo também não é inocente uma vez que remete para contextos históricos europeus muito especificos que identificavam políticas de discriminação e perseguição às comunidades de religião judaica por motivos religiosos ou “raciais”.
O objectivo desta amálgama de conceitos é clara: intimidar quem critica as políticas repressivas de Israel sobre a população autóctene (nomeadamente as confiscações de terras e as demolições de casas) associando-os às teses rácicas nazis. Colocam um rótulo e já não precisam de pensar mais!
O rótulo do "anti-semitismo" é assim um tigre de papel que é agitado quando não há outro argumento para defender as políticas de tipo colonialista do estado de Israel. Criticar a política de estado de Israel não tem nada a ver com anti-semitismo. É o mesmo que dizer que quem criticava a guerra colonial em Portugal era traidor à pátria ou anti-português.o termo "anti-semitismo" não faz sentido porque tanto são semitas os judeus como os árabes. Além disso, ao contrário do que muitas vezes se diz não se trata dum conflito contra o Islão uma vez que também existem comunidades cristãs árabes importantes e que são muito antigas, remontando ao sécI e II d.C. Aliás as três religiões ao longo de muitos séculos sempre conviveram na Palestina, exactamente até à época em que se procurou impôr um projecto sionista nesta região que passava pela expulsão da restante população.
A questão de fundo do conflito que ocorre na Palestina é que para haver paz é necessário haver justiça. Desde 1948 que está para se fazer a paz e a justiça, nomeadamente em relação aos palestinianos que foram expulsos das suas aldeias num verdadeiro processo de limpeza étnica. É curioso que a evocação desses factos ocorridos em 1948 (assim como as tácticas terroristas do Irgun, do Stern Gang ou do Haganah) ainda hoje cause tanto incómodo a muita gente. Os territórios ocupados, como por exemplo, Gaza são actualmente um grande campo de concentração totalmente bloqueado. A população palestiniana local é sujeita quotidianamente a todo o tipo de humilhações e isso explica em grande parte o problema do terrorismo.
A doutrina politico-militar do estado de Israel inspira-se nas teorias fascizantes e colonialistas de Zeev Jabotinsky (principal ideólogo do Likuud) que num artigo chamado "the iron wall" comparava os palestinianos aos indios e cuja "solução final" seria a sua expulsão forçada ou voluntária do "Eretz Israel". Escreve Jabotinsky que “Zionist colonization, even the most restricted, must either be terminated or carried out in defiance of the will of the native population. This colonization can, therefore, continue and develop only under the protection of a force independent of the local population – an iron wall which the native population cannot break through. This is, in toto, our policy towards the Arabs. To formulate it any other way would only be hypocrisy.(...) But the only path to such an agreement is the iron wall, that is to say the strengthening in Palestine of a government without any kind of Arab influence, that is to say one against which the Arabs will fight. In other words, for us the only path to an agreement in the future is an absolute refusal of any attempts at an agreement now.”
O unico caminho possível é o da Paz assente na Justiça e na Igualdade de todos, quer sejam judeus, muçulmanos ou cristãos.A simples manutenção do "status quo" pela violência não vai levar a nenhuma solução. Noutras paragens (como na Africa do Sul) as Comissões para a Justiça e Reconciliação deram bons resultados. Israel também precisa duma.
Afirmações do tipo "existe um anti-semitismo anti-judaico que se agudizou à esquerda desde a queda do Muro de Berlim" são puramente panfletárias. Associar a critica à poltica dum estado concreto a uma ideia de criminalização generalizada de toda uma religião, ou um povo é uma mistificação, essa sim panfletária, pretendendo subliminarmente criar um falso elo entre quem a faz os movimentos realmente anti-semitas existentes na Europa e nos EUA (tipo KKK).É óbvio que ainda existem na Europa focos residuais de anti-semitismo, como na Polónia, mas que são contra a presença de judeus na Europa e nada têm contra a política do estado de Israel, antes pelo contrário, ficariam contentes com a sua partida para Israel.A critica que faço a Israel, e que também fazem muitos israelitas (judeus e não-judeus) como o falecido Meir Vilner é basicamente um problema dos mais básicos direitos humanos e tem que ser debatido nessa base. O fundamentalismo islâmico utiliza a questão duma forma oportunista e instrumental mas a continuação desta doutrina politico-militar por parte de Israel favorecerá a prazo o seu crescimento.Não existe aqui nenhuma confusão entre a critica a uma doutrina politico-militar dum estado e uma absurda culpabilização colectiva (era o mesmo que dizer absurdamente que quem combateu o nazismo odiava os alemães e austríacos). Citando Amílcar Cabral diria que o inimigo é o sistema colonial e não o povo.
Aliás dentro do complexo mundo da filosofia e teologia judaica a questão do sionismo não é tão consensual como muitos imaginam.Pode-se ver por exemplo este site:(http://www.jewsnotzionists.org/index.htm) onde se diz “There are in fact many Jewish movements, groups and organizations whose ideology regarding Zionism and the so-called "State of Israel" is that of the unadulterated Torah position that any form of Zionism is heresy and that the existence of the so-called "State of Israel" is illegitimate.No one has had to create any antagonism between our Torah and Zionism because such antagonism exists by virtue of the essence of Judaism itself, which can never tolerate the heresy of Zionism.Zionism is wrong from the Torah viewpoint, not because many of its adherents are lax in practice or even anti-religious, but because its fundamental principle conflicts with the Torah. “
quarta-feira, agosto 23, 2006
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2 comentários:
Caro Tósilva: confundir todo um povo ou uma religião com uma política de estado é um erro. Não existem culpas colectivas.
Mesmo em Israel existem organizações como a Gush Shalom e o Hadash (Partido Comunista de Israel) que se manifestam contra a guerra. É claro que são minoritários e também a imprensa oficial procura silencia-los.
Eu considero o judaísmo apenas como uma identidade religiosa e não étnica.
Claro, o José Manuel tem razão: Há muitos judeus - praticantes ou não - decentes, como há gente decente em todo o mundo (até nos EUA): lembremos o Iury Avnery, o Norman Finkelstein e outros, que são justos, corajosos e tomam partido pelas vítimas.
Temos que ser equânimes, amigos, não somos gente de direita que tem como adquirido, por exemplo - esta ouvi-a ao imbecil do J M. Júdice - O Eixo do Mal - que qualquer comunista, pelo facto de o ser tem esquemas de pensamento rígidos, inflexíveis... e maldosos.
Calma então, pessoal.
Luis Nogueira
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