segunda-feira, agosto 28, 2006

"Guantanamo Airlines" e o Governo Português

Em diversos locais do globo pessoas são raptadas sob o pretexto de serem "suspeitas de terrorismo", levadas em segredo para prisões secretas onde são torturadas e, são colocadas posteriormente na prisão de Guantánamo, incomunicáveis drante anos. Alguns foram posteriormente libertados, após terem sofrido todos estes tratamentos, aparentememente porque "foi engano dos serviços secretos". Foi o caso, por exemplo, do cidadão turco Murat Kurnaz (ler aqui).
Os países europeus que têm convenções contra a prática da tortura sabiam mas fecharam os olhos e, em alguns casos, até colaboraram com acções à margem da lei. O governo português plos vistos também sabia que os aeroportos nacionais estavam a ser utilizados para uma actividade que é interdita pela Constituição da República Portuguesa, assim como por diversas convenções internacionais que a República Portuguesa assinou e faz de conta que nada aconteceu.
Sócrates recusa-se a dar explicações sobre este assunto ao alegando questões de soberania. Claro que por esta ordem de critérios Portugal não deveria sujeitar-e às directivas europeias em áreas como a agricultura, pescas, política orçamental e outras. A desculpa é no minímo incoerente. Mas mais grave é que mesmo quando questionado, há algum tempo atrás, na Assembleia da República por deputados portugueses José Sócrates continue sem esclarecer devidamente esta situação.

A Refundação da Direita

O Dr. Manuel Monteiro anda ultimamente bastante atarefado com o seu projecto de refundar a Direita. Curioso é que a sua primeira iniciativa política em tão ambicioso empreendimento tenha sido o de telefonar ao adjunto do ministro da Admnistração Interna para meter uma cunha junto do Governador Civil de Viana do Castelo para abrir uma excepção na autorização para realizar esta iniciativa uma vez que por inépcia ou incompetência não se tinha munido dos necessários documentos.

Este governo já perdeu todo o sentido da decência. Pelos vistos para o Ministério da Administração Interna há quem esteja dispensado de cumprir a lei. Veremos se no futuro outros partidos terão direito a tratamento similar.

"His Master's Voice" (2)

Hoje o Jornal de Notícias dá continuidade à sua linha editorial de porta-voz oficioso do governo. Desta vez é mais um ditirâmbico elogio, sem direito a contraditório, ao encerramento de diversas maternidades. Tudo é bonito, feliz e cor de rosa como no País das Maravilhas com títulos expressivos como "Sorrisos que calam polémicas" e frases como "Pela frente, o normal será repetir-se o cenário que o JN encontrou nas maternidades de acolhimento. Satisfação."

sexta-feira, agosto 25, 2006

"His Master's Voice"

O jornalista Paulo Ferreira, chefe de redacção do Jornal de Notícias assina hoje um editorial que é digno de emparelhar com as elegias de António Ferro ou com os editoriais situacionistas do vetusto "Diário da Manhã". É um exemplo de antologia do jornalismo reverente e obrigado sempre disposto a "engraxar" o poder instituído. Só que este é tão exagerado que até enjoa.

Depois de zurzir salomonicamente em todos os líderes e partidos da oposição, Paulo Ferreira remata com esta "pérola":
"o engenheiro José Sócrates bem pode continuar a construir a sua imagem de chefe intransigente de um Governo sem Oposição. Não há nada no horizonte que o possa atrapalhar. O povo português, que tanto aprecia a autoridade, cá estará para lhe agradecer, com votos, a condução do país. "

quarta-feira, agosto 23, 2006

Anti-semitismo ou Anti-sionismo?

Os acontecimentos decorrentes da agressão israelita ao Líbano, vieram agitar em alguns locais da blogosfera (nomeadamente aqui)a velha questão do anti-semitismo.
No fundo não há aqui nada de original. Segue uma linha decorrente do pensamento da direita americana que procura impedir a reflexão critica sobre a actual doutrina político-militar de Israel, nomeadamente em relação aos palestinianos.
A utilização do termo também não é inocente uma vez que remete para contextos históricos europeus muito especificos que identificavam políticas de discriminação e perseguição às comunidades de religião judaica por motivos religiosos ou “raciais”.
O objectivo desta amálgama de conceitos é clara: intimidar quem critica as políticas repressivas de Israel sobre a população autóctene (nomeadamente as confiscações de terras e as demolições de casas) associando-os às teses rácicas nazis. Colocam um rótulo e já não precisam de pensar mais!
O rótulo do "anti-semitismo" é assim um tigre de papel que é agitado quando não há outro argumento para defender as políticas de tipo colonialista do estado de Israel. Criticar a política de estado de Israel não tem nada a ver com anti-semitismo. É o mesmo que dizer que quem criticava a guerra colonial em Portugal era traidor à pátria ou anti-português.o termo "anti-semitismo" não faz sentido porque tanto são semitas os judeus como os árabes. Além disso, ao contrário do que muitas vezes se diz não se trata dum conflito contra o Islão uma vez que também existem comunidades cristãs árabes importantes e que são muito antigas, remontando ao sécI e II d.C. Aliás as três religiões ao longo de muitos séculos sempre conviveram na Palestina, exactamente até à época em que se procurou impôr um projecto sionista nesta região que passava pela expulsão da restante população.
A questão de fundo do conflito que ocorre na Palestina é que para haver paz é necessário haver justiça. Desde 1948 que está para se fazer a paz e a justiça, nomeadamente em relação aos palestinianos que foram expulsos das suas aldeias num verdadeiro processo de limpeza étnica. É curioso que a evocação desses factos ocorridos em 1948 (assim como as tácticas terroristas do Irgun, do Stern Gang ou do Haganah) ainda hoje cause tanto incómodo a muita gente. Os territórios ocupados, como por exemplo, Gaza são actualmente um grande campo de concentração totalmente bloqueado. A população palestiniana local é sujeita quotidianamente a todo o tipo de humilhações e isso explica em grande parte o problema do terrorismo.
A doutrina politico-militar do estado de Israel inspira-se nas teorias fascizantes e colonialistas de Zeev Jabotinsky (principal ideólogo do Likuud) que num artigo chamado "the iron wall" comparava os palestinianos aos indios e cuja "solução final" seria a sua expulsão forçada ou voluntária do "Eretz Israel". Escreve Jabotinsky que “Zionist colonization, even the most restricted, must either be terminated or carried out in defiance of the will of the native population. This colonization can, therefore, continue and develop only under the protection of a force independent of the local population – an iron wall which the native population cannot break through. This is, in toto, our policy towards the Arabs. To formulate it any other way would only be hypocrisy.(...) But the only path to such an agreement is the iron wall, that is to say the strengthening in Palestine of a government without any kind of Arab influence, that is to say one against which the Arabs will fight. In other words, for us the only path to an agreement in the future is an absolute refusal of any attempts at an agreement now.”
O unico caminho possível é o da Paz assente na Justiça e na Igualdade de todos, quer sejam judeus, muçulmanos ou cristãos.A simples manutenção do "status quo" pela violência não vai levar a nenhuma solução. Noutras paragens (como na Africa do Sul) as Comissões para a Justiça e Reconciliação deram bons resultados. Israel também precisa duma.
Afirmações do tipo "existe um anti-semitismo anti-judaico que se agudizou à esquerda desde a queda do Muro de Berlim" são puramente panfletárias. Associar a critica à poltica dum estado concreto a uma ideia de criminalização generalizada de toda uma religião, ou um povo é uma mistificação, essa sim panfletária, pretendendo subliminarmente criar um falso elo entre quem a faz os movimentos realmente anti-semitas existentes na Europa e nos EUA (tipo KKK).É óbvio que ainda existem na Europa focos residuais de anti-semitismo, como na Polónia, mas que são contra a presença de judeus na Europa e nada têm contra a política do estado de Israel, antes pelo contrário, ficariam contentes com a sua partida para Israel.A critica que faço a Israel, e que também fazem muitos israelitas (judeus e não-judeus) como o falecido Meir Vilner é basicamente um problema dos mais básicos direitos humanos e tem que ser debatido nessa base. O fundamentalismo islâmico utiliza a questão duma forma oportunista e instrumental mas a continuação desta doutrina politico-militar por parte de Israel favorecerá a prazo o seu crescimento.Não existe aqui nenhuma confusão entre a critica a uma doutrina politico-militar dum estado e uma absurda culpabilização colectiva (era o mesmo que dizer absurdamente que quem combateu o nazismo odiava os alemães e austríacos). Citando Amílcar Cabral diria que o inimigo é o sistema colonial e não o povo.

Aliás dentro do complexo mundo da filosofia e teologia judaica a questão do sionismo não é tão consensual como muitos imaginam.Pode-se ver por exemplo este site:(http://www.jewsnotzionists.org/index.htm) onde se diz “There are in fact many Jewish movements, groups and organizations whose ideology regarding Zionism and the so-called "State of Israel" is that of the unadulterated Torah position that any form of Zionism is heresy and that the existence of the so-called "State of Israel" is illegitimate.No one has had to create any antagonism between our Torah and Zionism because such antagonism exists by virtue of the essence of Judaism itself, which can never tolerate the heresy of Zionism.Zionism is wrong from the Torah viewpoint, not because many of its adherents are lax in practice or even anti-religious, but because its fundamental principle conflicts with the Torah. “

sábado, agosto 19, 2006

A crise do capitalismo global

"As carpideiras da falência do socialismo não se perguntam por suas causas nem denunciam o fracasso do capitalismo para os 2/3 da humanidade que, segundo a ONU, vivem abaixo da linha da pobreza. Assim, abraçam o neoliberalismo sem culpa. E o adornam com o eufemismo de "democracia", embora ele acentue a desigualdade mundial e negue valores e direitos humanos cultuando a idolatria do dinheiro e das armas."

Frei Betto (ler mais aqui: http://www.voltairenet.org/article142911.html)

sexta-feira, agosto 18, 2006

As confusões de José Manuel Fernandes

O director do Público anda um pouco confuso e com uma acentuada tendência para o disparate. Já estavamos habituados a ler os seus editoriais, normalmente repetitivos, onde invariavelmente se elogia o pensamento político neo-conservador e se faz a profissão de fé no triunfo absoluto do capitalismo sobre a esquerda e demais forças do Mal.
No editorial de hoje (18.08) do Público o disparate bate mais recordes do que Francis Obikwelu numa corrida de 100 metros. José Manuel Fernandes resolveu comparar, certamente por se tratarem de situações equivalentes, a participação de Günter Grass nas "Waffen SS" com o PREC, José Saramago e o DN.
È claro que José Manuel Fernandes não percebeu a diferença entre um instrumento de terror e repressão como foram as "Waffen SS" e um momento libertador que o povo português protagonizou e que extinguiu formas de servidão e subjugação com séculos de existência. Mas para quem viu na invasão do Iraque um novo 25 de Abril já nada surpreenda. Muito menos em quem visita um país, por acaso em guerra, com todas as despesas pagas pelo respectivo governo e depois escreve editoriais "isentos".
Mas para informação do JMF aqui vai uma pequena amostra do "curriculo" das "Waffen SS":
  • Na Campanha de 1944, a 2a Divisão Panzer SS “Das Reich” praticou uma das mais horríveis atrocidades ocorridas em solo europeu, a destruição da vila francesa de Oradour-sur-Glane, onde mais de 600 pessoas foram brutalmente assassinadas. Os homens por fuzilamento, e as mulheres e crianças, amontoadas dentro da igreja do vilarejo que foi incendiada de seguida. A 12a Divisão Panzer SS “Hitlerjugend” foi responsabilizada pela execução de 134 prisioneiros canadenses durante os conflitos na Normandia.
    Na Ofensiva das Ardenas, em dezembro, elementos do Leibstandarte SS sob o comando de Joachim Peiper, executaram mais de 90 prisioneiros de guerra americanos, em Malmedy.
    Na Frente italiana, tropas da 16a Divisão Panzergrenadier “Reichsführer-SS” operando em missão anti-guerrilha, levaram a cabo atos de selvageria ainda mais terríveis do que a destruição de Oradour. Em 12 de agosto de 1944, queimaram a vila de Sant’Anna di Stazzema, exterminando 560 pessoas. No dia 18 de outubro, aniquilaram a comuna de Marzabotto, na província de Bolonha. Ao se retirarem, as tropas das Waffen-SS deixaram para trás 1604 cadáveres de homens, mulheres e crianças. Além destes civis, 226 “partigiani” italianos foram executados. As atrocidades cometidas no Leste Europeu foram tantas que é quase impossível relatar todas, mas certamente foram piores do que as cometidas no Oeste.

Quando José Manuel Fernandes fala de "censura" eu também sempre achei estranho que o Publico não publicasse noticias desagradáveis para o Grupo SONAE. Ou se calhar talvez não seja assim tão estranho.

quinta-feira, agosto 17, 2006

Nos 50 anos da morte de Bertholdt Brecht

Passaran no dia 14 de Agosto 50 anos sobre a morte de um dos principais dramaturgos do século XX. As obras que nos legou são, vistas à luz do mundo contemporâneo saído da "Nova Ordem Capitalista" duma actualidade impressionante. Todos os seus traços estruturais, em obras como "Mãe Coragem", "Mahagony" ou "Ópera dos 3 Vinténs" estão aí presentes. E há também a música genial de Kurt Weill que acompanha a maior partes das suas peças.
Dos vários textos de Brecht (para além daquele que abre o blogue) escolhi este que me toca particlarmente:

Elogio da Dialéctica
A injustiça avança hoje a passo firme
Os tiranos fazem planos para dez mil anos
O poder apregoa: as coisas continuarão a ser como são
Nenhuma voz além da dos que mandam
E em todos os mercados proclama a exploração; isto é apenas o meu começo

Mas entre os oprimidos muitos há que agora dizem
Aquilo que nòs queremos nunca mais o alcançaremos
Quem ainda está vivo não diga: nunca
O que é seguro não é seguro
As coisas não continuarão a ser como são
Depois de falarem os dominantes
Falarão os dominados
Quem pois ousa dizer: nunca
De quem depende que a opressão prossiga? De nòs
De quem depende que ela acabe? Também de nòs

O que é esmagado que se levante!
O que está perdido, lute!O que sabe ao que se chegou, que há aì que o retenha?
E nunca será: ainda hoje
Porque os vencidos de hoje são os vencedores de amanhã